domingo, 11 de dezembro de 2011

Árvore de Natal







Já se passaram dez dias do mês de dezembro. Ela, já viveu tantos natais. Já não era mais uma menina, a dar-se conta ao se encontrar com o espelho todas as manhãs. As rugas de expressão contabilizavam seus anos de experiência, na vida. Era uma profissional requisitada, uma mãe razoável, uma boa vizinha, e sabia estacionar um carro na principal avenida da cidade. Era essa imagem que passava para as pessoas.


No entanto, ela sabia que tudo isso não constituía a verdadeira pessoa que era ela. Ao deparar-se com o espelho, as rugas, os cabelos que exigem tintura não a incomodavam. Ela se deparava todas as manhãs com outra criatura refletida no espelho. Aquela que só ela e mais outra pessoa conhecia. Infelizmente outra pessoa era ciente da existência dessa outra personalidade. Era incomum, doloroso, impuro experimentar isso.
Dúbia, resolveu sair, pelas ruas largas com o intuito de esquecer um pouco essa agonia que lhe afligia a alma. Os enfeites natalinos, nas arvores, nas paredes dos prédios, serviam somente para lhe deixarem mais transtornada com sua angustia. O natal se aproxima.


O natal, ele aprendeu que era um momento tão familiar. Mas esse ano, ela não sabia se merecia um natal em família. E desejava apagar a data do calendário e passar direto para o carnaval, com aquele mote de profanidade. Mas, era impossível que isso ocorresse. Caminhava mais rapidamente sem rumo certo, dobrava esquinas, e surpreendia-se com o encontro de alguém conhecido, que mesmo quando se tratava só de um cumprimento, ninguém se esqueceu de desejar o feliz natal. Todos tem que viver mesmo o natal? Ela murmurava.


Já estava enfadada da peregrinação vespertina, sentou-se em uma calçada revestida de ladrilhos, ali mesmo ela fez seu balanço do ano, com uma dose de desespero, ela relembra que esse ano se permitiu experimentar um sentimento diferente de todos. Era devastador, irresistível. Viveria, sim viveria. Antes de habituar-se ela prometeu e juramentou a si mesmo que era só uma vez, de modo que, apagaria da memoria por tratar-se somente de um momento. Aquele instante foi experimentado numa tarde de quinta feira de janeiro.


Com o coração apertado, uma carga de dois jacás abarrotados de culpa, ela volta para casa, e retoma suas atividades corriqueiras, dentro de uma normalidade encenada. Observa como se aproximou rápido esse dezembro. Compreendeu, naquele momento, que quebrara seu juramento todas as quintas feiras, do ano em curso. Sempre prometendo em silencio que seria a ultima vez. E logo imbuída da mais pura loucura, se deixava abraçar por aquele que ela jamais deveria ter experimentado o primeiro beijo. 


Aquele para qual foi o seu par nesse ensaio, era um menino de olhar plácido que todos os dias, ocupa o assento frontal da mesa na sala de jantar e partilha o café da manhã de uma família contemporânea, constituída por pai, mãe, e novos irmãos. Naquele domingo comum, ele trajando  somente um calção azul o peito à mostra,   acomoda-se na mesa farta, arruma o café na xícara, e enquanto passa lentamente a manteiga nos dois lados do pão, observa o pai, que degusta o café sem pressa e profere: Não me esperem  para a ceia de natal.
 Olha calmamente para ela sem esboçar nem uma emoção e diz: O presente de minha madrasta já está embaixo da arvore de natal. Feliz natal, família. 




2 comentários:

Anônimo disse...

Ainda não tinha, apesar de conhecer o blog, lido-o da forma como li agora. Muito bacana, bem feito e de muito bom gosto. Acho interessante a idéia posta no texto de que não vai mais acontecer. Quanto mais se reluta, quanto mais dissemos que não queremos o que queremos muito, mais essa coisa nos pega e nos atira para circunstâncias inusitadas do cotidiano. Queria que a história do FERREIRA, tivesse essa imagem de poesia.

Vanusa Babaçu disse...

A poesia na coragem de se permitir viver episódios que marcam uma vida inteira.

SEI QUE esse comentário é baiano.

Um beijo,

Grata por prestigiar